Aceitei ser embaixador da Provedoria dos Animais de Lisboa. Não escolhi nenhuma instituição, entre as tantas que existem, acontece que fui convidado por esta. Procurei perceber, muito rapidamente, o que se espera de mim, esclarecidos os termos, aceitei, com muito orgulho. Por esta altura, é conhecido o meu empenho pessoal pela causa. Sublinho o “pessoal”, palavra importante para o que quero dizer. Quando defendo os mais básicos direitos dos animais, faço-o pela minha consciência de cidadão. Tenho a sorte de trabalhar numa empresa gerida por pessoas inteligentes, responsáveis e humanistas. Que me permitem estas acções, porque convém não esquecer que sou jornalista. E este ponto é importante. Não quero, não posso, não devo, por várias razões deontológicas, esquecer a minha profissão quando dou a cara por uma campanha. Tento explicar os limites da minha participação: há uma série de questões ligadas aos animais, como as touradas, os circos, ou mais recentemente a nova lei do abate em canis municipais, que dividem profundamente a sociedade portuguesa. Nestes casos, não posso, não devo e não quero tomar partido. Pela simples razão de que a minha profissão me poderá colocar frente a frente, a qualquer momento, com defensores de diferentes pontos de vista. São, aliás, matérias onde se encontram, se quisermos ser calmos e sérios, teses defensáveis. Não quer dizer que as partilhe, mas sou obrigado, por dever profissional, a aceitar, compreenda ou não. São, também, matérias onde todos sabemos que os combates verbais são acesos, e muitas vezes terminam em insultos mais ou menos velados. São discussões que detesto e que evito e evitarei a todo o custo. Onde me posso então colocar na minha posição de “embaixador” de uma instituição preocupada com os animais? Em dois campos, que se cruzam, e sobre os quais, aliás, escrevo há muito tempo sem qualquer constrangimento: os maus tratos e o abandono. Aqui, não tenho dúvidas ou hesitações. Não perceberei nunca quem é capaz de maltratar um animal, de o abandonar de qualquer forma. É, para mim, uma das mais básicas questões humanitárias. Porque é precisamente de humanidade que se trata: a forma como tratamos fracos e indefesos diz tudo da pessoa que somos. Por vezes, após estas crónicas, um punhado de pessoas parece querer indignar-se comigo. Perguntam-me: isso dos animais é muito bonito, mas e então as pessoas? São menos importantes, é isso? Prefere animais a pessoas? É uma questão tão descabida e estúpida que nem merece resposta, mas vou dá-la, pela milésima e última vez. É absolutamente óbvio que desprezo e abomino qualquer mau trato sobre pessoas, sobretudo as indefesas, com especial destaque para crianças, idosos ou portadores de uma deficiência. Não esqueço que a cobardia que leva pessoas a maltratar outras está intimamente ligada à certeza de um poderio físico sobre o outro, ou seja, a cobardia do mais forte. É o que leva, também, a tantos casos de violência sobre mulheres. Bem sei, bem sei, que também há casos de violência de mulheres sobre homens, mas consultem as estatísticas, por favor. Os números não têm comparação. É por todas estas vítimas inocentes, os mais fracos e indefesos, que erguerei sempre a minha voz, enquanto puder e me deixarem. Não vou, provavelmente, mudar o mundo, mas ainda assim… Se formos muitos a pensar assim, talvez possamos contribuir para ir mudando mentalidades, sobretudo nas gerações que estão a crescer. Não esqueçam que as crianças perpetuam o mundo que vêem, e os exemplos do que presenciam tornam-se o mundo que conhecem.
Rodrigo Guedes de Carvalho: Mudar, nem que seja devagar
É por todas as vítimas inocentes, os mais fracos e indefesos, que erguerei sempre a minha voz, enquanto puder e me deixarem.