1 – Seria de prever, mas ainda me consigo espantar. Ouvi esta semana comentários de colegas jornalistas. Falavam de um anúncio de televisão, no qual entra Mário Crespo. O tom era corporativo, desconfiado, maldizente, os narizes torcidos. Jornalismo e publicidade são Pólo Norte e Pólo Sul. Eu sei disso, e não me passa pela cabeça que resmas de jornalistas desatem a fazer publicidade a marcas puramente comerciais. Publicidade a causas humanitárias é história bem diferente (ainda acredito eu…). Mas voltando ao anúncio do Mário. Perante tanto falatório, fiquei atento. E já vi. E pergunto: e depois? Qual é o problema daquele anúncio? Podemos gostar mais ou menos, achar mais ou menos piada àquela robot do futuro. O que vejo, da parte do Mário, é inatacável e bem-disposto. Para quem o conhece, aliás, é o seu registo. Agora, o mais importante. O Mário está reformado, ao que sei. Já não é, oficial ou tecnicamente, jornalista (embora se diga que o somos sempre, cá dentro). É, pois, livre de entrar nas aventuras de gozo e remuneração que entender. Só para mentes muito tacanhas esta brincadeira “mancha”, de alguma forma, uma carreira tão longa e singular. O Mário teve momentos profissionais menos bons (todos os temos), mas os seus bons foram muito bons. Teve, e tem, a coisa mais difícil na exposição pública. Carisma. O que não se treina nem ensina. E que muitas vezes provoca invejazinhas da treta. Deixem-no sossegado.
2 – Impressionou-me, naturalmente, a morte de alguém tão jovem como Avicii. Não sabia que tinha apenas 28 anos. É sempre de uma tristeza enorme, sobretudo quando se percebe que sofria de problemas que o deveriam ter travado na bebida. Mas isso são contas pessoais, e interessam pouco agora. Dito isto, o meu choque e respeito pela partida de uma vida, há que acalmar alguns ânimos, em minha opinião. Na vaga gigantesca e previsível de comentários nas redes sociais, alguns colegas do rapaz levaram tão longe a sua dor que escreveram que o seu desaparecimento traz o mesmo vazio que nos deixaram Bach ou Mozart… Aqui, lamento, alto e pára o baile. A morte de Avicii serve para nos lembrarmos dessa figura que simboliza os novos tempos, o disc-jockey. É, para mim, um mistério, eu que me arrepio com cada dedilhado de guitarra dos meus velhinhos vinil, que vejo a forma como os grandes bateristas atacam a fera, como o baixo olha para o cantor, como o pianista sabe quando entrar, como é emocionante verificarmos o talento de quem toca e canta. Por isso os admiramos, por esse talento que a maioria de nós não possui, nem em sonhos. Nunca percebi, portanto, o fenómeno do DJ. Acho patético que encha estádios, mas tenho de pensar que é um tipo de mentalidade, do fácil e medíocre, que está em linha com outros fenómenos da sociedade. Que cada um goste do que gosta e seja feliz. Agora, meus amigos, não tragam Bach e Mozart para a conversa. Nem me obriguem a explicar porquê.