1 – Gosto de ser português, adoro o meu país acima de qualquer outro, não me imagino a viver noutro. Regra geral, gosto do temperamento português, com as suas pequenas loucuras e tiques. Mas. Há uma característica que me tira do sério, e que cada vez mais me parece vir do facto de sermos um país mimado. O que me tira do sério, na última semana, é a rapidez com que passamos da angústia com a seca para o lamento sobre o temporal. Precisamos, desesperadamente, de chuva. Repito: desesperadamente. Para o presente, para o futuro próximo, e na esperança de que o País não se transforme num deserto árido a médio prazo. Mas é mais forte. Para os portugueses, qualquer pequeno inconveniente é uma grande maçada. E quando a chuva cai finalmente a sério, e deveríamos ir para rua dançar a agradecer este adiamento de um futuro que parece certo, oiço multiplicarem-se as queixas pela maçada. A maçada que é abrir e fechar o guarda-chuva, a molha que se apanha até chegar ao carro. Tenham dó. Aprendam, de uma vez por todas, a apreciar o que temos e sobretudo o que não temos. Não temos temporais que deixam milhares desalojados, não temos nevões que paralisam cidades ou até regiões inteiras, não temos frio que mata os mais desabrigados. E não, também não temos (por enquanto) uma secura que feche as torneiras e obrigue a racionamento de água. Vamos ter calma na mania de que nos queixarmos por tudo e por nada, que é como quem diz, porque está calor ou porque está frio.
2 – Não me interessa para nada se é o Benfica, o Sporting, o Porto ou o Cova da Piedade. Chocam-me as sucessivas demonstrações de que o futebol português é um sítio mal frequentado. Sim, eu sei, não me obriguem a repetir que sei bem que suspeitas são suspeitas, que não há acusação formal disto ou daquilo, muito menos julgamento, muito menos sentença. Bastam-me os indícios, reais, que têm levado as autoridades a um número pouco recomendável de investigações, buscas e apreensões. Os provérbios não nascem por acaso, e aquele do não há fumo sem fogo terá a sua razão. É vergonhosa, de qualquer ângulo, a dimensão de suspeitas e a variedade de crimes em questão. E terão, com toda a certeza, uma raiz comum: pessoas ligadas a clubes de futebol a tecerem teias que nos levam a desconfiar, cada vez mais, do espectáculo mais apreciado no País. Com que ânimo, dentro de pouco tempo, se celebrarão vitórias, neste nevoeiro crescente de desconfianças? E tive um especial cuidado a escrever: referi pessoas ligadas a clubes, porque os clubes, e a esmagadora maioria dos seus adeptos, não têm qualquer culpa ou influência. Os clubes são vítimas. E é triste, muito triste, perceber como a grandeza dos clubes atrai pessoas que só os prejudicam, com a ironia de julgarem estar a trabalhar nos bastidores para o seu bem. O futebol nasceu para ser resolvido em 90 minutos num relvado. Qualquer obtenção de resultado por outra via é uma vergonha. Que pode bem matar o próprio futebol.