Voltou a acontecer. É como se constasse num agenda, acontecimento marcado para um dia destes, demore mais ou menos. É como se integrasse um plano, que todos conhecem, a que todos têm acesso. Escrever “massacre numa escola nos Estados Unidos” tornou-se tristemente repetitivo, assustador de tão banal. Hoje foi este, venha o próximo. Bem sei que aconteceram, também, antes de Donald Trump. Mas a verdade é que, de cada vez que se repetia, Barack Obama punha a tónica do seu discurso de dor na arma que o assassino empunhava. Na facilidade com que ele, ou qualquer desmio-
lado como ele, pode ter acesso a uma máquina de destruição. O discurso de Trump (mais um) faz por esquecer esse pormenor. Não dá jeito, claro.Apoia-se na tese, bacoca e demagógica, que nos quer convencer que “as armas não matam, quem mata são as pessoas”. Eu diria de outra forma: quem mata são as pessoas com acesso a armas. Trump chega ao embaraço constrangedor de vir dizer que o que falta é vigilância de indivíduos desequilibrados. Sim, também. Mas repito: esses indivíduos, além de desequilibrados, têm acesso a metralhadoras. Ou outras barbaridades que lhes permitem matar de longe e em rajada cobarde. Queria ver esse mesmo potencial homicida munido de simples canivete… Deixemo-nos de coisas, recordemos a simplicidade do provérbio que lembra que a ocasião faz o ladrão. É uma vergonha mundial, que acumula vítimas inocentes, esta mania de Trump assobiar para o lado na questão das armas. A questão é muito básica. É a força. É a força que permite, na maioria dos casos, que homens selvagens batam nas mulheres anos a fio. Que as mantenham prisioneiras de um terror constante.
A força é parte integrante (e decisiva) da nossa História. Foi à força que ditadores cometeram genocídios e mantiveram o poder. Apesar de toda a poesia, foi à força que os combatentes da liberdade os conseguiram derrotar (quando conseguem). É, pois, de força que falamos quando um qualquer adolescente franzino irrompe numa escola e abate crianças como animais no matadouro. A força não está no seu desequilíbrio, está na arma. A simples ideia, aliás, de sair de casa e dirigir-se à escola está assente na arma. Sabe que, sem ela, não conseguirá o terror, pelo menos nas proporções a que temos assistido. É isso que tem de mudar, e sem isso nada mais terá possibilidade de travar a sangria. Quer dizer que, se o controlo de armas for eficiente, não haverá mais massacres? Não. Óbvio que ninguém o pode assegurar. Mas também me parece claro que diminuirão, em enorme escala. Lamento, no entanto, que o círculo vicioso continue: massacre muitas lamentações nas redes sociais, muita reza, depois discussão no Facebook, que leva a que se diga que o Congresso deve discutir as armas, depois o tempo passa, nada acontece, a coisa cai no esquecimento, parece lá muito ao longe. Depois, um dia, algumas crianças despedem-se dos pais com um beijinho, vão para escola. E não voltam.
Rodrigo Guedes de Carvalho: Então até ao próximo
Escrever “massacre numa escola nos Estados Unidos” tornou-se tristemente repetitivo, assustador de tão banal.