Lado a lado, quatro jurados e três juízes irão sentar-se no Tribunal de Torres Vedras, para julgar Francisco Leitão, 44 anos, ou Ghob, o autodenominado “Rei dos Gnomos”. Entre outros crimes, Leitão está acusado da autoria de quatro homicídios e da ocultação dos cadáveres de Tânia, Ivo, Joana e António D’Albuquerque. O tribunal será presidido pela juíza Maria Domingas, que será coadjuvada por mais dois juízes e quatro jurados (ver caixa). Os quatro jurados estão em maioria, e terão por isso capacidade para sobrepor a sua decisão à dos juízes.
Selecção de jurados
A selecção dos jurados parte de um sorteio feito no universo dos eleitores inscritos nos cadernos eleitorais da cidade onde decorrerá o julgamento. Neste caso, Torres Vedras. Chegados a um grupo final de 18 eleitores, a escolha foi feita com a participação dos magistrados (juízes e Ministério Público), da defesa e dos advogados assistentes das famílias das vítimas. Alguns dos seleccionados no sorteio foram rejeitados. Ou por terem antecedentes criminais ou por revelarem juízos de valor na entrevista. Um desses, por exemplo, disse ficar surpreendido se o Ghob pudesse ser ilibado. Foi dispensado. Dos oito jurados finais, já estão definidos os efectivos e suplentes. Todos terão de acompanhar o julgamento na íntegra. A qualquer momento, os suplentes podem ser chamados a avançar, caso aconteça algum imprevisto com os efectivos. Por isso, todos irão receber 102 euros por sessão. A primeira sessão está marcada para 9 de Janeiro e as outras para os dias 16, 17, 18, 19 e 23 de Janeiro. Até agora, Ghob tem negado a autoria dos homicídios. É a sua defesa.
Crimes I
Francisco José da Cruz Leitão está preso no estabelecimento prisional anexo à Polícia Judiciária (EPPJ), em Lisboa, desde 22 de Julho de 2010, suspeito de homicídio qualificado, ocultação de cadáver e sequestro de quatro pessoas: António D’Albuquerque, conhecido por “Pisa-Lagartos”, um velhote da região, sem família, que trabalhava para Leitão até desaparecer há uns anos, Tânia Ramos (27 anos), desaparecida a 5 de Julho de 2008, Ivo Delgado (22 anos e namorado de Tânia), a 26 do mesmo mês, que mantinha uma relação homossexual com Leitão e, a 3 de Março de 2010, Joana Correia (16 anos), que, por ser menor (e depois de muita insistência da família), deu origem às investigações.
Crimes II
Ao juiz de Instrução, o “Rei dos Gnomos” disse já ter respondido perante a Justiça. Por falsificação de documentos, burla e posse de arma proibida. Disse ter tido relações sexuais com Tânia durante um ano e uma união de facto de quatro anos com Ivo. Disse que usou o carro e o cartão multibanco de Ivo, porque os pais dele lho deram, mas estes desmentiram-no.
Imputável
As avaliações feitas no Instituto Nacional de Medicina Legal de Lisboa revelam que Francisco Leitão tem consciência do que faz. Uma personalidade vulnerável, com traços de narcisismo e comportamentos antissociais. Manipulador, frio e instável, revela baixa tolerância à frustração. Violento, projecta a responsabilidade dos seus actos em terceiros. Não padece de qualquer doença psicológica que lhe perturbe a capacidade de avaliação e decisão, por isso é imputável.
Um Castelo e um alçapão secreto em Carqueja
O “castelo” da Carqueja está rodeado de câmaras de filmar com estatuetas e símbolos diversos, dentro e fora de portas. Começou a ser construído há uns anos, nos escombros do casebre da sucateira do pai de Leitão – Reciclagem Estremadura – há muito desactivada. Os gnomos de Ghob foram os pedreiros desta construção. A tvmais denunciou a existência de uma divisão secreta na primeira reportagem que publicou sobre este caso. Meses depois, a PJ descobriu a cela subterrânea, separada do exterior por um corredor e isolada de som, onde alguns rapazes relatam ter sido abusados. Ninguém conhecia Carqueja (Lourinhã) até Julho de 2010, quando o Ghob foi preso. A tvmais esteve lá antes e depois de Ghob ser preso. “A PJ que investigue!”, exclamou-nos um velho habitante, enquanto uma viúva relembrou Leitão em pequeno e disse que “nos campos do pai dele é que devem estar os mortos”.